O que a medicina diz sobre as mentes criminosas?
Gene HTR2B pode predispor seus portadores a reagir sob o impulso do momento e de maneira irrefletida. Apesar de a presença desta herança genética ter se mostrado mais frequente nos criminosos, os cientistas ressaltam que sua presença não é suficiente para provocar ou prever o comportamento impulsivo.
Pesquisas mostram que o comportamento violento tem origens biológicas, psicológicas e socioambientais
Crimes violentos e inexplicáveis costumam intrigar as pessoas. Afinal, o que faz uma pessoa agir de forma descontrolada e cruel? Pesquisadores de todo mundo vêm se dedicando a estudar a mente e o comportamento de criminosos em várias partes do mundo.
O psiquiatra forense e pesquisador da Unicamp, Eduardo H. Teixeira, explica que vários estudos já demonstraram que o comportamento violento é decorrente da associação de fatores socioambientais, psicológicos e biológicos.“Neste sentido, um indivíduo que carrega em seus genes herdados aspectos relacionados à maior propensão de ser violento, terá maior chance de expressar esse comportamento caso esteja em um ambiente social desfavorável”, explica.
O pesquisador da Unicamp e psiquiatra forense Eduardo Teixeira
O estudo mais recente, feito na Finlândia, relaciona a impulsividade a vários distúrbios psiquiátricos e a comportamentos violentos. A pesquisa feita com presidiários de lá revelou que uma mutação pode predispor seus portadores a reagir sob o impulso do momento e de maneira irrefletida. A mutação está presente no gene HTR2B, um receptor de serotonina, neurotransmissor que atua no controle de impulsos. A descoberta foi feita após os pesquisadores sequenciarem e compararem o DNA de condenados por crimes violentos com um grupo controle.
Estudos que associavam a herança genética com a pré-disposição de determinados grupos de indivíduos para assassinato e estelionato, atividades usurárias, perversidade sexual, alta traição etc, foram desenvolvidos no século XIX e início do século XX, por toda Europa e EUA – NR.
A pesquisa foi feita com 96 presidiários por um grupo internacional e os resultados publicados na revista Nature.
Denominada HTR2B Q20, a mutação se mostrou três vezes mais presente entre os presidiários do que nos demais. Os 17 condenados que carregavam a mutação (do total de 96 analisados) cometeram em média cinco crimes violentos, 94% dos quais sob a influência de bebidas alcoólicas. Os crimes se constituíram em reações agressivas a eventos menores sem premeditação ou ganho financeiro.
Apesar de a presença da mutação ter se mostrado mais frequente nos criminosos, os cientistas ressaltam que sua presença não é suficiente para provocar ou prever o comportamento impulsivo. Segundo Laura Bevilacqua, do Instituto Nacional sobre Abuso de Álcool e Alcoolismo dos Estados Unidos, outros fatores devem ser levados em consideração, como gênero, níveis de estresse ou consumo de álcool. Por conta disso, reforçam, mais estudos são necessários para entender melhor o papel particular dessa mutação descoberta agora.
Comportamento
O pesquisador da Unicamp esclarece que comportamento violento e impulsividade são aspectos um pouco distintos do comportamento humano. “A agressividade ou comportamento violento é uma dimensão mental e comportamental própria do ser humano, uma experiência pessoal e manifestação comportamental fundamental para a sobrevivência e adaptação. É considerado fenômeno normal quando ocorre em contexto apropriado e em decorrência de motivos pertinentes à adaptação”, define.
A agressividade, por outro lado, “é definida como sintoma psicopatológico quando ocorre fora de contextos adaptativos e também quando ocorre destoando claramente de padrões culturais. O comportamento violento será detonado na ocorrência de determinados estímulos, mas também na dependência da característica básica do indivíduo .”
Psicopatia
O termo psicopata foi descrito pela primeira vez em 1941 pelo psiquiatra americano Hervey M. Cleckley, do Medical College da Geórgia. A psicopatia consiste num conjunto de comportamentos e traços de personalidade específicos. À primeira vista, os psicopatas são vistos como pessoas normais, mas costumam ser egocêntricos, desonestos e adotam comportamentos irresponsáveis. Não sentem culpa, são insensíveis e detestam compromisso. A maioria dos psicopatas é homem.
O instrumento mais usado entre os especialistas para diagnosticar a doença é o teste Psychopathy checklist-revised (PCL-R), desenvolvido pelo psicólogo canadense Robert D. Hare, da Universidade da Colúmbia Britânica. O método inclui uma entrevista padronizada com os pacientes e o levantamento do seu histórico pessoal, inclusive dos antecedentes criminais.
Psicopatas reagem de modo diferente a estímulos
Criminosos em série ou conhecidos pelo seu elevado grau de crueldade rendem boas histórias no cinema e na literatura. Também são alvo de inúmeras pesquisas científicas ao redor do mundo. Estudando esses criminosos, os cientistas descobriram que os psicopatas respondem de maneira diferenciada aos estímulos externos e processam informações de forma diferente.
O pesquisador Eduardo Teixeira conta que o comportamento violento do psicopata é planejado e plenamente deliberado. “Vários estudos já demonstraram alterações na neurofisiologia do cérebro do psicopata. São indivíduos que não reconhecem nas pessoas determinadas expressões afetivas, como a de sofrimento, dor, entre outras, ou reconhecem de forma diferente da população geral. São geralmente incapazes de sentir culpa, arrependimento e ainda pode sentir prazer com situações de sofrimento alheio”, define.
Um estudo apresentado em 2003 no Reino Unido mostrou que quando pessoas normais mentem, existe atividade ampliada no lobo frontal. Isso sugere uma experiência de culpa e desconforto. Essa atividade não é verificada quando os psicopatas mentem.
Outro estudo constatou que psicopatas reagem de forma diferenciada quando vêem palavras fortes como ´estupro´ ou ´assassinato´. As mudanças que ocorrem em sua atividade cerebral diferem completamente das mudanças que ocorrem nos cérebros de não psicopatas.